segunda-feira, 12 de dezembro de 2011

Dia do Bairro Alto

O Bairro Alto em festa quer dizer que não morre
Nasceu em Dezembro de 1513 e está a festejar 498 anos. A primeira casa, ainda como Vila Nova de Andrade, está testemunhada num tabelião de Lisboa. Na manhã do passado domingo o Conservatório Nacional teve dois cantores a darem a boas vindas a um grupo de moradores do Bairro Alto que ainda resistem. A orquestra do Conservatório, sob a direcção de Alexandre Branco, executou peças de Mozart, Beethoven e Mendelssohn. O concerto para piano e orquestra de Mozart teve como solista Bárbara Costa. Foi uma abertura solene e cosmopolita para o aniversário de um bairro onde sempre se cantou o Fado, se fizeram e ainda fazem livros e jornais, onde João Garcia de «Mau tempo no canal» de Vitorino Nemésio passou as suas angústias à espera da carta de Margarida e onde Molero viveu as suas aventuras nas ruas perto do «Farta Brutos» e nas páginas de Dinis Machado. Hoje o Bairro Alto tem os seus filhos cada vez mais longe. Uns em Londres, outros em Dublin, outros a caminho da Austrália. Um ex-morador desabafa: «Se não fosse ter um bebé pequeno, também eu emigrava!»
O segundo andamento da «Eroica» de Beethoven mais parece uma marcha fúnebre. Solene embora mas triste como um epitáfio. Havia um Bairro Alto cheio de vida mas os jornais fecharam quase todos, os editores foram-se embora, os alfarrabistas também estão de partida, muitos escritórios fecharam e procuram outros lugares da cidade onde a EMEL ainda não fez a sua terra queimada. Entre a emoção do concerto final de Mozart com Bárbara Costa ao piano, firme, atenta, suave, tirando do teclado todas as modulações possíveis da partitura, fica uma angústia e uma pergunta: «Será que a pianista também vai emigrar»? O Bairro Alto festeja ainda o seu aniversário e, com esse gesto teimoso de festa, quer dizer que não morre.
José do Carmo Francisco

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